“Precisa-se adotar uma menina de 12 a 18 anos que resida, para cuidar de uma bebe de 1 ano que possa morar e estudar...”. Este é um trecho do anúncio publicado nos classificados de um dos maiores jornais do Estado do Pará, no último sábado (01/05), no qual um casal de empresários se propõe a “adotar” uma menina. O caso, ganhou as redes sociais e a imprensa em geral e, desde então, vem gerando grande repulsa na sociedade, especialmente da região norte.
O anúncio, identificado como situação de exploração do trabalho infantil doméstico, foi denunciado por um advogado, na manhã do domingo, à presidente da Associação dos Magistrados Trabalhistas da 8ª Região (Amatra8), juíza do trabalho Claudine Rodrigues, que levou ao conhecimento dos demais integrantes do grupo de parceiros do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, coordenada no Pará pelo Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região. Em pouco tempo, os integrantes se mobilizaram e logo a Polícia Civil, o Ministério Público do Trabalho e os demais parceiros da rede de proteção estavam em campo.
Acompanhando o caso desde o início, a juíza do trabalho Maria Zuíla Lima Dutra, membro da Comissão Nacional do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil do TST/CSJT e gestora regional, afirma que esta articulação mostra a importância da Programa que já reúne mais de 80 parceiros, no Pará. “Sozinhos somos limitados e quando fomos integrados a esta comissão, sabíamos que já existiam diversas instituição atuando no combate ao trabalho infantil, como MPT, MPE, SRTE, Conselhos Tutelares, ONG's governamentais e não governamentais, só que cada um trabalhando isoladamente. A partir do Programa decidimos fazer parcerias com todas estas instituições e órgãos, com pessoas físicas e jurídicas. Além das ações realizadas, discutimos diariamente pelo whatsapp, vários problemas do trabalho infantil no Estado e, quando tomamos conhecimento deste caso, logo nos mobilizamos e cada um foi direcionado a agir de acordo com sua área de atuação. Desse modo vamos trabalhando, todo mundo se ajudando e fortalecendo o grupo. Estamos todos interessados em resolver a questão”, afirmou.
Para ela, esse triste episódio mostra que a conscientização da sociedade é uma das maiores barreiras a se enfrentar na luta pela erradicação do trabalho infantil. “Enquanto existirem pessoas que pensam como o casal do anúncio, essa perversa chaga social vai continuar. Não é por acaso que o Pará foi o único Estado da Federação que teve o índice de trabalho infantil doméstico elevado no último censo do IBGE. Como sabemos, é uma questão que precisa ser modificada, urgentemente”.
Segundo Maria Zuíla, no Pará, infelizmente, esta é uma situação muito frequente. “É uma situação em que se está amputando a infância. Adotar é um ato de amor, de uma família que se dispõe a receber alguém em seus laços familiares. Não é o que acontece com estes 'filhos de criação'”, afirma.
Investigação
Na segunda-feira, o MPT instaurou investigação. Na Polícia Civil, a apuração está sob a responsabilidade da delegada Simone Edoron, titular da Diretoria de Atendimento a Grupos Vulneráveis. Conforme declaração ao site Agência Pará, a delegada explicou que começaram “o levantamento de dados, do endereço, e vimos que havia uma terceira pessoa, além do casal anunciante, no processo. Alguém que, no primeiro momento, se identificou como advogado que se sensibilizou com a situação do casal, que precisava de ajuda. Depois, em oitiva, essa pessoa confessou que prestava apenas assessoria para um escritório de advocacia”.
A Polícia Civil identificou o casal responsável pelo anúncio, que faltou à convocação para prestar depoimento na segunda-feira (04) e deve ser ouvido nesta terça-feira (05). “Posteriormente vamos ouvir os responsáveis pelo jornal e também outras pessoas que, no decorrer do processo, descobrirmos. Agora, estamos apurando as condutas criminosas que existem no caso, para saber se isso se trata de retrocesso, desconhecimento da lei ou aliciamento de menores”, afirmou a delegada.
Novo caso
Com a repercussão do caso nas redes sociais, um caso semelhante foi identificado em Marabá (Pa). O anúncio foi publicado por uma mulher no grupo “Vendas, compras e trocas – Marabá”, do Facebook, onde a mulher procura “uma menina que precise de ajuda financeira, para morar … se for menor de idade pretendo por na escola para estudar, levar e buscar, cuidar como filha”. O caso chegou ao conhecimento do juiz do trabalho titular da 2ª VT de Marabá, Jônatas Andrade, que acionou o MPT na cidade, que está apurando o cado. O caso também já é de conhecimento da Polícia Civil, que está averiguando a situação.