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Crise é um tema recorrente na atualidade. Mas preparar-se para ela ainda é um desafio a ser vencido pelas organizações.Este ano, dentro das ações de aprimoramento da governança institucional, o TRT8 inicia a implementação do seu Programa de Gestão de Riscos. Um trabalho que deverá envolver a todos na 8ª Região.
Para entender a importância do tema, leia a entrevista abaixo com João José Forni, professor de Comunicação Pública e das Organizações, autor do livro “Gestão de Crises e Comunicação – O que Gestores e Profissionais de Comunicação precisam saber sobre Crises Corporativas”.
ASCOM - Professor Forni, falar e pensar em crise é quase um tabu nas organizações. Qual orientação o senhor daria aos gestores, neste sentido?
JJ Forni - O tema “gestão de crises” demorou muito a entrar na pauta das organizações, principalmente no Brasil. Mas não há como ignorá-lo. Hoje, cada vez mais se ressalta e se valoriza o ativo mais importante de uma organização, a reputação. E as crises, quando não administradas, batem direto na reputação, quando não a liquidam, causam um estrago que levará anos para ser recuperado. A orientação é colocar o tema gestão de crises na pauta das reuniões de planejamento estratégico, nas discussões sobre as ameaças e oportunidades da empresa, da organização. Inserir a gestão de crises nas discussões internas, nas reuniões de planejamento, como um assunto e uma preocupação que não pode ser lembrada somente quando acontecer uma crise. O gestor deve estar ciente de que um dia a crise pode chegar. E, se chegar, que ele deve estar preparado para enfrentá-la.
ASCOM - Fale do papel da gestão de risco no trabalho da crise.
JJ Forni - Gestão de risco é um dos pilares da gestão de crise. Quando se fala em fazer gestão de crises, implícito está que a empresa, a organização pública, está fazendo prevenção, monitoramento, treinamento de problemas que podem dar crises. Porque o processo de gestão de crises inicia com a prevenção. Há um equívoco, muitas vezes, de que fazer gestão de crises é ter uma estratégia pronta para a hora que ela chegar. Isso é muito bom. Mas o pior momento para gerenciar uma crise é durante a crise. Portanto, isso deixa bem claro que deve haver um trabalho antecipado, de auditoria das vulnerabilidades para que fatos negativos não aconteçam de surpresa. A organização, sabendo o que pode acontecer de negativo, que possa gerar uma crise grave, se antecipa e evita que o acontecimento cause um transtorno irreversível ou afete a imagem e reputação da empresa ou do órgão público definitivamente. Quando vemos as denúncias mais recentes da Operação Lava Jato, aparece bem claro que as empresas ou executivos envolvidos não faziam gestão de riscos. Mesmo aqueles que não estão diretamente envolvidos. Houve uma omissão de muitas diretorias e de muitos gerentes e diretores nesse particular.
ASCOM - Os gestores e colaboradores possuem papéis diferentes na crise, mas todos com sua importância. Qual esse papel?
JJ Forni - As crises não são gerenciadas pela comunicação. Ela é um vetor importante na crise, diria até imprescindível e decisivo, mas quem gerencia a crise são os gestores da organização. Eles têm o comando de áreas ou da empresa e devem liderar, no Comitê de Comunicação, a estratégia de conter e combater a crise. A Comunicação entra com a versão, cabe a ela defender a percepção que os diversos públicos terão sobre como a organização está se comportando na crise. É um papel importantíssimo também. O insucesso na gestão da crise pode vir de ações mal conduzidas, omissão, precipitação ou lentidão; ou de erros na Comunicação. Os colaboradores deverão estar sempre informados. O papel deles é receber a informação e serem multiplicadores da versão da empresa. Para isso, essa explicação tem que ser transparente, direta, clara, com um compromisso com a verdade e para com a sociedade e os afetados pela crise.
ASCOM - Como os gestores devem preparar suas equipes e instituições para situações de crise sem gerar alarmismo?
JJ Forni - Falar sobre crise numa empresa é mais ou menos como falar em morte na família, quando tudo está bem. O que acontece nas famílias com a morte, é muito parecido com a forma como as empresas se comportam em relação à crise. Fingem que não vai acontecer. Omitem-se. É um erro. Esse é um tema que deve ser falado abertamente, sem alarmismo. Sob a ótica de que as crises fazem parte da natureza das organizações e que a maioria delas, apesar de terem enfrentado crises graves, sobreviveram, com maiores ou menores arranhões. O errado é fingir que não haverá crise; que está tudo sob controle, quando não está. A empresa está em situação financeira difícil, no gargalo, atrasa pagamentos de fornecedores, e os dirigentes escondem dos empregados e dos clientes. Errado. É preciso “disclosure” completo para que a empresa possa encontrar, com a ajuda de bancos, do mercado, dos empregados, e até dos clientes, o caminho da recuperação.
ASCOM - Quando a crise chega sem preparação, qual deve ser a postura do gestor? Qual o risco em se ignorar a crise e adiar ações?
JJ Forni - Quando a crise chega sem preparação, e a maioria delas ocorre assim, por culpa da própria gestão que ignorou os sinais, as chamadas “bandeiras vermelhas”, os dirigentes e a Comunicação entram em campo já perdendo. Terão que conter a crise, para a empresa poder se recuperar. O risco de ignorar a crise e adiar ações é ela tomar uma proporção que os dirigentes não possam mais conter. O exemplo recente é a crise da mineradora Samarco. Essa crise é gravíssima. Para complicar, a cada dia a Polícia Federal, o Ministério Público Estadual e até empregados divulgam informações, relatórios e fatos que agravam o cenário. Quando você ignora alertas, por questões de custos, incompetência, indecisão, é muito provável que a crise será extremamente perversa para os resultados e o futuro da organização. Mais ou menos como um doente que vai protelando a ida ao médico e, pior ainda, o tratamento. Quando chega ao médico, haverá um tratamento apenas paliativo, mas não irá curar. Com as organizações funciona assim: empurrar problemas para baixo do tapete, ignorar alertas é abrir as portas para crises graves. Transparência total, humildade e respeito aos “stakeholders” seria a receita ideal.
ASCOM - Quem deve compor um gabinete de crise?
JJ Forni - Um Gabinete de Crise, algumas organizações chamam de Comitê de Crise, Sala de Situação, depende da natureza do negócio e do tipo de organização. Na área pública, um Gabinete de Crise formal precisa ter um Coordenador, que não deve ser o principal gestor. Esse gestor precisa estar conduzindo o “negócio” da organização. O Comitê terá também representantes das áreas Jurídica, Comunicação, gestão de pessoas, segurança e informações (em alguns casos também a Auditoria e o "Compliance"), a área envolvida na crise e, eventualmente, o assessor parlamentar, quando envolver assembleias estaduais ou o Congresso Nacional. Uma empresa de consultoria só entra no Comitê numa fase mais avançada das decisões. Compõe-se de não mais do que 12 pessoas.
ASCOM - A crise reflete não só na imagem como na reputação da instituição. Qual o papel da comunicação tanto para o público interno como externo?
JJ Forni - O papel da Comunicação, como já adiantei, é decisivo. A Comunicação é guardiã da marca e da reputação das organizações. Muitas crises se agravam por omissão ou erros na Comunicação. E não se trata apenas de saber a hora certa de agir; ou fazer um Comunicado de esclarecimento ou ainda coordenar uma entrevista. Essa é a parte formal. Há algo mais importante que é a estratégia que deve ser sugerida ao Comitê de Crise, pela Comunicação, de como a empresa vai se comunicar naquele evento negativo; qual vai ser a forma de explicar a crise; quem vai ser o porta-voz; quando irão falar; que instrumentos utilizar. Essa estratégia pode determinar o êxito ou o fracasso da empresa naquela crise.A comunicação é parte integrante do “staff” de crise ou time, como se prefere dizer. Ela participa de todas as reuniões e de todas as decisões sobre a crise. E sabe tudo o que está acontecendo com a maior transparência possível. Para o público interno, a regra é a mesma: transparência total. O empregado não pode ficar sabendo da crise na empresa pelas redes sociais ou por terceiros. Ou ainda pelos sites de notícias. A estratégia de comunicação com o público externo, numa crise, depende muito da gravidade do evento, do local e das circunstâncias em que ocorreu. Mas o que vale para a mídia, vale para o público externo. Embora a mídia seja apenas um dos vetores que fazem a crise chegar até o cliente, o acionista, fornecedores ou influenciadores.
Você sabia?
Em 2015, o Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região elaborou a Política de Gestão de Riscos (Resolução TRT Nº 31/2015) e o Manual de Gestão de Riscos (Portaria PRESI nº 1068/2015).